Quando um medicamento é usado frequentemente, sofre
diminuição do seu efeito.
POR ANDRESSA BASILIO - PUBLICADO EM 30/06/2010
O uso abusivo de medicamentos controlados já supera o
consumo somado de heroína, cocaína e ecstasy, segundo relatório apresentado
este ano pelo Departamento Internacional de Controle de Narcóticos, órgão
ligado à ONU. O psiquiatra Marcelo Niel, do Programa de Orientação e
Atendimento a Dependentes da Unifesp (Proad), atribui o aumento da procura por
medicamentos psicotrópicos ao estilo de vida da população. "Os problemas
como estresse e ansiedade têm crescido cada vez mais e fazendo com que as
pessoas busquem aplacar estes males", diz.
Outro problema comum que tem contribuído para o aumento do
consumo de remédios controlados diz respeito à prescrição por médicos de áreas
que não são as mais indicadas para receitar remédios psicotrópicos. Não é raro
endocrinologistas, ginecologistas e até alguns pediatras receitarem calmantes,
antidepressivos e remédios para emagrecer. "Não é porque o especialista é
de outra área que não pode receitar o remédio corretamente. Mas, há muitos índices de erro por causa da falta de conhecimento prévio sobre os efeitos
desse tipo de remédio", explica o especialista da Unifesp.
Quando as pessoas entram no consultório tentando achar
soluções rápidas para as dores psicológicas que sentem, cabe ao médico saber a
hora certa de medicar o paciente ou encaminhá-lo para um profissional mais
qualificado no assunto. Mas não é só medicamentos com receita controlada que
precisam de atenção especial.
Os remédios simples que compramos na farmácia podem, em vez de ajudar, causar problemas para a saúde. No Brasil, 80 milhões de pessoas têm o hábito de se automedicar, segundo levantamento da Associação Brasileira das Indústrias Farmacêuticas (Abifarma).
"A automedicação vem de uma forte questão
cultural. É difícil mudar isso. Todas as casas têm um monte de medicamentos e
as pessoas cada vez mais pensam que sabem resolver seus problemas sem a ajuda
do médico", afirma Rosany Bochner, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz), vinculada ao Ministério da Saúde.
O perigo da
dependência
Um dos maiores problemas da automedicação é a dependência.
Segundo a pesquisadora, tomar anti-inflamatórios toda vez que se tem dor nas
costas, pode virar um vício, a ponto de o princípio ativo do remédio não fazer
efeito no organismo, quando for realmente necessário. A mesma coisa acontece
com frequência em relação aos descongestionantes nasais.
"Os componentes
dos medicamentos podem gerar um efeito rebote quase tão devastador como os de
drogas ilícitas. Quando um medicamento é usado frequentemente, ainda que em
pequenas quantidades, sofre uma diminuição progressiva do seu efeito. Ou seja,
o indivíduo que antes melhorava com um comprimido, agora precisa de dois",
explica a pesquisadora.
Além da dependência, outro problema decorrente da
automedicação é o mascaramento dos sintomas e a demora em procurar o médico.
"O atraso no diagnóstico pode ser sério e levar à morte. Os antitérmicos,
por exemplo, se não forem usados com cautela, cortam a febre, mas a doença
continua e pode se agravar se a pessoa não procurar um especialista", diz
Rosany Bochner.
Não há exceções
Qualquer remédio traz consigo efeitos colaterais, que às
vezes se manifestam prontamente ou às vezes demoram. Portanto, é necessário
saber que o abuso de qualquer tipo de medicamento, mesmo que ela seja vendido
sem receita é prejudicial. Os
antibióticos, por exemplo, quando usados de maneira incorreta podem inibir as
bactérias do intestino, impedindo a absorção de nutrientes, ou, ainda, em casos
mais graves, podem levar a diarreias crônicas, causando desidratação.
Já o uso
indiscriminado de anti-inflamatórios pode levar ao aumento da pressão arterial
e a complicações nos rins e estômago. Combinar medicamentos sem orientação médica, bem como
alterar doses previamente estabelecidas podem ser altamente prejudiciais.
"A interação medicamentosa é outro problema grave da automedicação. Muitas
vezes a pessoa está tomando um remédio e decide usar outro por conta própria, o
que pode gerar reação entre os componentes dos dois medicamentos, o que pode
agravar o problema ou até gerar um novo", alerta a pesquisadora da
Fiocruz.
Um exemplo disso são alguns remédios para emagrecer, que quando
combinados com antidepressivos provocam cardiopatia.
Procure sempre um
profissional
O psiquiatra da Unesp José Manuel Bertolote acredita que
todo armário de medicamento tem uma quantidade além do que a deveria estar lá.
"As pessoas começam a utilizar o remédio e quando param ou terminam o
tratamento e ainda sobra medicamento na caixa. O que normalmente acontece é que
quando ela volta a ter sintomas parecidos, volta a usar o remédio excedente.
Ou, pior ainda, indica para um vizinho ou amigo que está com um problema
parecido", explica.
A verdade é que não conseguimos entender tudo o que acontece
com o nosso corpo. Em que momento eu preciso começar a tomar remédios? Por
quanto tempo continuarei tomando? Quantas vezes ao dia? São perguntas que você
não consegue responder sem a ajuda de um médico ou um profissional qualificado.
"A ajuda médica é fundamental para o sucesso de
qualquer tratamento. Mas, não basta só ir ao médico. O paciente precisa dizer
ao médico tudo o que tomou e o que está sentindo" acredita o psiquiatra
José Manuel Bertolote, da Unesp.
Para o psiquiatra, também é preciso entender que o remédio
não é solução para todos os problemas. Ficar triste um dia não significa
precisar de antidepressivos. O estresse não se resolve só com calmantes. A
insônia pode ser um sinal de que algo na sua rotina deve mudar.
Os exercícios físicos e as atividades de lazer são ótimas
substitutas para os remédios. Mudar hábitos alimentares já pode melhorar muito.
Dá próxima vez que achar que precisa de remédio tente pensar em alternativas
mais saudáveis.
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